Amor em tempos de dor

Conheci meu esposo, Laurence, quando tinha 14 anos. Ele foi meu primeiro namorado, aos 15. Nessa época eu já sabia que queria casar com ele, mas éramos muito novos e a vida ainda traria muitas surpresas e aventuras pra nós até nos reencontrarmos de novo. Nossa história é cheia de reviravoltas e algumas idas e vindas até nos casarmos quando completei 22 anos. Eu estava cheia de alegria, a mistura de ter casado com o amor da minha vida, a apreensão em estar saindo de casa e começando uma nova vida. Eu era completamente apaixonada pelo meu marido. Sempre admirei o jeito livre com que ele se relaciona com Deus, como ele é inteligente e como ele era apaixonado por mim. Estávamos totalmente envolvidos pelo amor e paixão.

Logo que começamos nossa vida a dois também iniciamos o trabalho no ministério. Laurence como pastor auxiliar e eu como voluntária. Iniciamos como pastores dos adolescentes, um tempo muito gostoso. Até hoje temos vínculos com os adolescentes daquela época e frutos também. Foi marcante e intenso aquele começo. Mas durante nossos primeiros anos ali houve algumas situações na igreja local e o Laurence foi colocado como pastor titular interino. Ali estávamos nós, eu com 24 e ele com 25, dando um grande passo. Um passo que esperávamos não ser maior que as nossas pernas, mas entrando em um terreno desconhecido que pediria de nós mais do que poderíamos imaginar.

A igreja que assumimos passou por um período conturbado, vivemos momentos delicados e pesados. Com essa situação o Laurence ficou bem deprimido. Bem deprimido mesmo. Clinicamente deprimido. Ele pediu licença do ministério e começamos a trabalhar pra que ele se recuperasse. (Já falei sobre depressão em outros textos e em como eu e o Larry passamos por ela juntos, principalmente quando eu adoeci, mas dessa vez foi ele. A vida (a dois) é dinâmica, como deve ser.

Eu nunca tinha visto o meu marido daquele jeito. Ele perdeu a vontade de viver. (Atenção para esse detalhe… nem sempre a pessoa que perde a vontade de viver, quer morrer. Ela simplesmente não tem forças pra viver, a vida parece pesada demais) Nessa época eu conversei com um dos nossos mentores e ele me disse: ‘Ore por ele. Fale sobre as verdades de Deus, que são constantes independentemente das circunstâncias’. E assim eu fazia, tentava… Mas era difícil! Em alguns momentos foi tão difícil que ele não queria levantar da cama por dias. Nessa época ele questionou sua vocação de vida, a sua paixão por servir a Deus e às pessoas. Ele questionou o porquê de eu continuar ao seu lado. ‘Tu és nova, és bonita. Não sei por que ainda ficas. Devias ir viver a tua vida e encontrar alguém que tenha vida pra caminhar do teu lado’. Ele me disse isso algumas vezes. Eu chorava sozinha, não queria adicionar o peso do meu choro em seus ombros, mas precisava chorar… sabia que não estava só, o meu Pai do Céu sempre ouvia.

Vez ou outra eu tinha conversas com amigos que traziam paz ou esperança… Minha maior estratégia como uma mulher tão jovem, com pouca experiência de vida, era lembrar da minha própria experiência com a depressão. E sempre isso tinha a ver com: O QUE É A VERDADE! O que é a verdade que está escondida por trás da mentira que quer me convencer de que Deus perdeu o controle?

Um dia eu conversei com a minha cunhada mais velha, a Karini. Ela é bem realista e sabe te fazer pensar, também ama a Deus e sabe que é amada por Ele, de quebra ama muito o Larry e é amada por ele também hehehe… Eu estava muito angustiada, já havia passado muito tempo, meses, eu estava exausta, parecia que a vida estava estagnada. Meu marido ali, inerte… só de corpo presente porque não era mais ele… Ela disse algo que me marcou: “Cunhada, ninguém pode fazer essa escolha por ti. Ninguém pode te julgar. Só tu podes dizer se tu vais ficar ou se vais embora. Eu sei o quanto tu amas o Laurence, mas o que vocês estão vivendo é algo muito difícil! Tu és tão nova. É uma decisão complexa mas ela é tua! Só tu podes dizer se vais ficar ou não”.

Uau! Então toma aí essa bomba de verdade no teu colo.

Eu tinha por volta dos 25/26 anos, casada há menos de 5 anos, vivendo um período pesado… Aquela conversa me sacudiu. Me vi adulta de verdade, dona da minha vida e responsável pelas minhas decisões.

Precisei me examinar, pensar, orar… Me perguntei se queria ficar, se valia a pena. O que aquilo significaria pra mim? Naquele dia eu lembrei da Mical de 15 anos, do dia do nosso casamento, de quando eu fiquei deprimida, de tudo o que já havíamos vencido juntos. Não foi romântico, foi racional e intencional. Lembrei do que aprendi sobre amor durante toda a minha vida e sobre o que a gente escuta por aí também. “Você tem direito de ser feliz”. Sim… e também tenho a minha palavra e o compromisso que firmei, diante de Deus e dos homens, de estar com ele na saúde e na doença. Ali… chorando, me casei de novo com meu marido. Decidi ficar.

Não posso dizer que depois desse dia o Laurence mudou da água pro vinho, como num passe de mágica. A vida real não é assim. Alguns meses se passaram, em câmera lenta, parecia. Nos mudamos para São Paulo, eu trabalhando bastante e o Laurence, agora um pouco melhor, tentando voltar a ser ele, ou uma versão parecida.

Me lembro de estarmos conversando com uns amigos na nossa casa e ver o Laurence interagindo com eles do jeito que ele é de verdade… fazia tempo que não o reconhecia. Naquele dia, eu o vi. O abracei e agradeci a Deus. Meu marido estava voltando.

Essa é uma parte da minha história. É o jeito que vivi aquele momento. Caminhando sempre ao lado do meu Pai, que me dava forças e mantendo minha palavra porque o “amor tudo crê, tudo espera e tudo suporta“, mesmo quando não é divertido, mesmo quando as circunstâncias parecem gritar o contrário. Não sou perfeita, nem estou aqui pra lhe dizer para seguir meus passos.

Quero dizer que perseverar é caminhar mesmo sem a certeza da vitória, mas esperando por ela. Viver em fé.

Acredito na “teologia do chão da vida”, como aprendi com um mentor  amigo. Se Deus não for pra caminhar comigo em meio à dor, então a caminhada não serve. O sofrimento é certo, mas a presença Dele ainda mais.

Que miserável homem que sou, que me tornei

Mendigo o pão que antes sobrava e que era meu

No desapontamento a esperança nasce

E vivo o presente independentemente do que passou

Pois se tudo mudou

E em Cristo eu sou mais do que sou

Pra trás eu deixo o homem que fui

E as casas que eu construí longe de Ti

Se tudo mudou eu abro as velas da embarcação

Na esperança que pela manhã

Avistarei o porto onde Te encontrarei

Como um refugiado deixando seu país

Fugindo pela noite sem conseguir dormir

Confiando na promessa que o pranto toma a noite

Mas logo vem o dia, e gritos de alegria ecoarão!

Se a chuva me alcançar e o barco revirar que eu acorde em terra firme lá

Esperança – Os Arrais

15 comentários sobre “Amor em tempos de dor

  1. Muito bom, Mical!…

    Você lembra os solavancos da vida, que, entre trancos e barrancos, experimentamos na jornada… Voce expõe as teses e antíteses, que, mesmo sem sínteses, vão nos tornando verdadeiros filósofos do cotidiano, reflexivos, flexíveis, mais sensíveis — capazes de suportar até o que nos parece insuportável…

    Parabéns!…

    Muito mais do que um relato sobre os trechos percorridos, e as impressões que as alternâncias da paisagem lhe causaram, foram as lições que você absorveu, que impregnaram sua alma — da certeza de nunca estar só, que o simples sobreviver é viver, que (mesmo quando o horizonte parece inalcançável) a travessia vale a pena, prosseguir é melhor que chegar…

    Degustei e… Gostei…

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  2. O qto caminhamos pra chegar até aqui…i dont wanna close my eyes…i dont wanna miss a thing…thank god i found u…ur a godsend, a blessing from above and ur a godsend to me…and he must have spent a lil more time on u…cuz he knew the kind of 😜 cracray i would be…i came back, cuz we belong together… (*wink to all the composers that gave me words for this including Mariah)…i luv Us — amo esse nós!

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