Eu e as panelas já tivemos vivências interessantes ao longo de nosso relacionamento. Na maior parte do tempo, eu sentia certa animosidade por parte delas, como se estivessem torcendo para que eu tomasse decisões equivocadas durante a execução das receitas. É fato que – preciso admitir – sempre mantive uma relação superficial com as amigas metálicas. Mas minha atitude mudou em janeiro deste ano, quando interrompi a carreira profissional para mergulhar na “vida a dois”. Estou casada há apenas oito meses e todos os dias sinto-me como uma estagiária perdida em suas funções, já que antes não exercia as atividades domésticas com regularidade. Não que eu tenha nascido em berço de ouro. Longe disso! Meu pai é pastor presbiteriano antes mesmo de eu nascer. Ainda solteiro, abdicou a vida empresarial para tornar-se evangelista e ministro do Evangelho anos mais tarde. Enquanto isso, minha mãe ascendia rapidamente em sua carreira, sendo a renda principal da casa. Mas quando eu e meus dois irmãos ainda éramos crianças, Deus a chamou para servir em tempo integral como esposa, mãe e líder nos ministérios em que atuava.
Então cresci em uma família com intensa vida ministerial e por isso meus pais precisaram contratar jovens senhoras para auxiliá-los no dia a dia, o que me deixou em uma situação cômoda desde pequena e ainda mais confortável quando cheguei à juventude e passava a maior parte do dia entre a faculdade e o trabalho. No entanto, nada justifica minha acomodação, a qual eu percebi com clareza em 2017, enquanto me preparava para casar. Eu e outras moças nos reunimos durante dois meses para estudar um livro chamado “A Experiência do Lar”, da autora Devi Titus, que abordarei num próximo texto. Com a orientação de uma mentora desse ministério, percebi que a workaholic aqui precisava se aprofundar mais na missão que Deus confiou a mim enquanto mulher e esposa. Mas como fazer isso se vivia intensamente os desafios profissionais e ministeriais fora de casa? Após meses de oração e leitura da Bíblia, horas de solitude e de diálogo com meu noivo, meus pais e minha liderança, entendi que era tempo de pausar a carreira e enviar currículo para o cargo de “Esposa Trainee”. E o processo de seleção conta com a supervisão das amigas-panelas.
O estrogonofe
Meu marido já havia saído para trabalhar e o relógio apontava a hora de iniciar o almoço. Naquele dia faria meu primeiro estrogonofe de carne, depois de receber conselhos da mamãe, da sogrinha e do Google. As informações estavam na cabeça mas tinha medo de cometer erros no processo e na dosagem dos ingredientes. Muito aflita (não pense que é exagero!), ajoelhei no quarto e orei: “Deus, eu não sei fazer isso. Era mais fácil quando eu só precisava escrever matérias. Me ajuda nesse estrogonofe!”. Levantei e enfrentei os olhares repressores das panelas, com a mesma atitude de oração que sempre vi na minha mãe. Foi ela que me ensinou a orar durante o preparo das refeições. Quando a elogiávamos pelo sabor dos alimentos, ela dizia: “Eu orei para que ficasse gostoso”. Aprendi com a dona Lucilia que dependemos da direção do Pai não apenas nas grandes decisões, mas em todas. Seja na renúncia da carreira de gestora e executiva ou em uma simples pitada de sal. Falar com Ele e buscar a Sua direção é o lugar seguro para quem deseja escolher conforme a vontade de Deus. Vontade essa já revelada e disponível na Palavra viva e que pode ser traduzida pelo Espírito Santo por meio de recursos inesgotáveis. Dentre as ferramentas usadas estão as “casas de barro” ao nosso redor, o que me leva ao conto do bolo Luiz Felipe.
Bolo Luiz Felipe
Eu e minha amiga Raquel tínhamos uns 12 anos quando fizemos juntas nosso primeiro (e único bolo). O desafio era levar algo para a confraternização da nossa classe da Escola Dominical e por isso nos debruçamos sobre a receita do bolo Luiz Felipe, também conhecido como Bolo Engorda Marido, Bolo de Leite e Bolo Mole. Nosso planejamento foi irretocável: pegamos a receita com a tia Ester (mãe da Raquel), compramos os ingredientes e escolhemos uma assadeira em formato de coração para impressionar a turma. Com os itens em mãos, começamos a preparar a massa com muita alegria, porém com zero de comunicação. E só descobrimos o erro fatal quando provamos a massa. Uma virou pra outra e disse: “Tá doce demais, né?”. Então eu disse: “Mas eu segui a receita direitinho, coloquei duas xícaras de açúcar…”. Nesse instante ela me interrompeu: “Peraí! Eu também joguei duas xícaras de açúcar aí dentro!”. Como não havia mais nada a fazer, rimos bastante, assamos o bolo e levamos o “coração de mel” para a classe no dia seguinte, dizendo que a receita era, na verdade, uma espécie de cocada.
Histórias como essa podem se repetir no cotidiano e causar sérios problemas por causa da falta de comunicação entre nós. Se estamos conectados com o coração do Pai, é natural que tenhamos conexão com nossos irmãos e irmãs, com os seres diferentes que Ele colocou em nossa caminhada para nos ensinar mais sobre o Amor e a Sua forma de decidir as coisas. Há impacto sobre outros em tudo o que fazemos e também quando deixamos de agir. É interessante pensar que as ovelhas do Pastor conhecem a Sua voz e o seguem sem hesitar, em total dependência (João 10.1-21). Porém a ovelha anda ao lado de um rebanho inteiro. Precisa ouvir os sons das demais e olhar em várias direções se não quiser atropelar e ser atropelada. Em uma geração onde cresce o culto a si mesmo, ainda há tempo de abandonar nossos falsos tronos e ouvir o que dizem os supostos “súditos”. O que nossos pais têm a ensinar? Quais os anseios do nosso cônjuge? Onde nossos irmãos estão sangrando? O que as crianças desejam e não conseguem expressar? O que nossos líderes gostariam de ouvir?
Que prossigamos em conhecer o Pai e escutar o próximo com os dois ouvidos. Quem sabe assim descobriremos os temperos da sabedoria ausentes em nossas panelas.
Fotografia: Pexels
Obrigada por esse texto.
E pela indicação do livro. Acho que ser esposa (bíblica) hoje é um grande desafio, num mundo onde isso tem sido colocado de lado.
Que o Senhor nos fortaleça e ajude a enfrentar esses leões diários rs.
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E que grande desafio, Mônica! Seus textos tem ne edificado muito, viu? Também quero ler o do Rev. Heber Campos Jr. Valeu pela dica!
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amo teus textos! Lindamente importante e delicado!
:*
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