A cidade em que moramos é bem pequena. Temos duas avenidas principais com alguns restaurantes bons, e alguns supermercados. Se quisermos comemorar alguma data especial, ou até mesmo ir a uma churrascaria, temos que dirigir de uma a três horas para cidades maiores que dispõem de restaurantes melhores, cinemas mais confortáveis e com som digital, ou fazer compras em lojas diferentes. Muitas vezes o roteiro inclui parar no Cheesecake Factory, um restaurante que serve de tudo, mas tem sua especialidade neste bolo-meio-pudim de queijo. Vocês podem imaginar a minha expectativa durante a viagem de carro, sonhando com o novo sabor de cheesecake que vou provar, ao passo que debato comigo mesma se devo escolher um novo tipo de torta, já que a última que comi estava tão gostosa…
E assim seguimos nosso dia na cidade grande, primeiro o churrasco, depois compras e cinema, e por último, a grande sobremesa! Só que neste dia resolveram não ir. Todos estavam cansados da correria do dia, e decidiram retornar, já que eram mais de 3 horas de viagem para a voltar para casa. Fui remoendo o meu sonho de comer cheesecake, chateada porque fui a minoria que queria ter essa experiência gastronômica. E percebi que enquanto os companheiros de viagem conversavam, eu pensava no sabor que queria ter pedido no restaurante. Quando me perguntavam alguma coisa, respondia de forma ríspida e com um sarcasmo nada sutil: Sim, gostei do filme, mas com certeza a torta estaria melhor que aquele final! Queria deixar claro, sem precisar usar todas as letras, que ficara chateada por não termos feito o combinado, e termos pulado a parte, a meu ver, mais interessante da viagem: o bendito cheesecake!
Penso que a maioria dos nossos conflitos aconteça por desapontamentos como este, claro, em escalas maiores. Estas decepções, em sua maioria, têm suas raízes nas expectativas desencontradas na realidade. Eu, na minha veneração pelo açúcar, achava que o dia só estaria completo depois de ter comprado a minha grande fatia de cheesecake, enquanto outros estavam completamente contentes com a aventurinha que incluíra comida e entretenimento. Aliás, para eles, o mais importante era a companhia que estava ali. Mas eu, a vossa comilona de plantão, queria mais.
Pior, não sabendo expressar o desapontamento de forma saudável, ou mesmo quão importante era, para mim, ter saboreado o quase pudim de queijo, me enrosquei num espiral de comiseração e agressividade passiva. Se me perguntavam se estava tudo bem, secamente respondia: sim. E revirava os olhos, sonhando com o cardápio perdido.
Ao ser confrontada com meu egoísmo e cinismo, tive que admitir que, além de não ter aproveitado o restante do passeio, reduzi o significado da saída com os amigos a uma simples questão: a minha expectativa. Veja bem, não há nada de errado em desejar comer uma boa sobremesa num local que é especializado em fazê-la. Isto é um desejo sincero de uma alma que ama açúcar. O problema reside na minha reação à esperança adiada.
Há inúmeras maneiras de lidar com a dita decepção. Uma delas é fazendo uma sincera análise da raiz do problema, perguntando a si mesmo se carrega dentro de si é um desejo ou uma expectativa. Note que o primeiro reside em uma vontade de que algo aconteça, a segunda já o torna um requerimento para felicidade. Feita esta distinção, passo a criar um diálogo interno sobre o conflito que toma forma em momentos quando meu desejo não acontece, e, assim, decido se vou agir em torno dos sentimentos oriundos da decepção ou não.
Ouvi uma frase há um tempo atrás que ressoa até hoje em minha mente: “se ainda for importante daqui a um ano, então converse sobre isso. Se não for, deixe ir embora”. Admiti, então, que o Cheesecake Factory ainda estaria ali, para futuras oportunidades de saborear uma das melhores sobremesas que já provei. Engoli meu egoísmo e minha fadada expectativa, que não eram nada doces, respirei fundo, e curti o resto da jornada. Chegando em casa, achei uma receita de cheesecake online, e fui tratar de aprender a fazer.
Fotografia: Kraft® Recipes